segunda-feira, 1 de agosto de 2011

1º Filme do Ciclo Especial


Crime Delicado, como os demais filmes de Beto Brant, parte de um ato de violência. Mas, se nos longas anteriores a violência era um ato presente, uma afirmação que exigia respostas dos personagens, em Crime Delicado a violência se transforma em interrogação – e o motor do filme não é mais a ação dos personagens, mas suas dúvidas.

O crítico de teatro Antonio Martins é um homem pleno de certezas. Domina com desenvoltura seu métier, sabe utilizar a ironia e o sarcasmo. Mas suas certezas (e sua empáfia) caem por terra depois de um encontro casual com Inês, mulher muito bonita, com uma deficiência física: falta-lhe uma perna. A dúvida se instaura. Martins também se descobre incompleto: falta-lhe aquela mulher. Ele a persegue. Surgem incômodos, no personagem e no público (...)

 O cinema de Brant (apesar de todas as limitações dessa classificação) aproxima-se a uma tendência realista, o que nos leva a pensar no estatuto de verdade das imagens do cinema contemporâneo. Brant usa longos planos-seqüência, buscando um mundo que se manifesta por si. No improviso dos atores nas cenas do bar, Brant busca a espontaneidade, mas também o acaso. De tão raros, os cortes se tornam mais “explícitos”. A montagem, essa grande violência do cinema com as imagens capturadas pela câmera, esse procedimento que Bazin “interditou” em seus textos. A montagem em Crime Delicado, como os faux raccords do início da carreira de Godard, serve para explicitar a “violência” da construção cinematográfica.

Tudo em Crime Delicado gira em torno dessa “violência”: a violência da representação e as dúvidas que surgem daí.  (...) As certezas que se esfacelam frente ao mundo não são apenas as do personagem principal, mas toda uma idéia de fazer cinema. (...)

Crime Delicado é cinema que não se quer “completo”, mas que busca a lacuna que levará o espectador a perseguir suas próprias respostas e encarar suas próprias falhas. É a frase do ator Adriano Stuart que resume a beleza do filme: “Eu errei”. Não há, no cinema brasileiro recente, “erro” mais necessário e esclarecedor que este Crime Delicado.

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