Todos os dias, às 18:30h, na rua das laranjeiras, para ser mais exata bem no prédio da Rio Filme, tenho um encontro marcado com a nostalgia e o projeto ao mesmo tempo. O que acontece comigo nesse encontro?
Acontece uma mágica. O momento é mágico. Não poderia ocorrer outra coisa, afinal “os caras” que estavam em meus livros estão agora falando comigo, eles falam de futebol também, eles têm corpos enrugados pelo tempo, eles são seres humanos de verdade. Quando eles me fazem uma pergunta, é difícil responder, gosto de ouvi-los o tempo todo, gosto de observar seus gestos de gênios e, sempre que posso, gosto de abraçar-lhes apertado.
Mas voltando à nostalgia e ao projeto... Um dia, quando percebi em minha vida que haviam outras pessoas por trás da tela da televisão e o quão poderosas essas pessoas podem ser , tracei um objetivo em meu caminho que talvez pudesse ajudar o mundo ao meu redor, a comunidade de terra em que tomava banhos de chuva e chegava em casa com lama da cabeça aos pés (haja ouvidos para a mãe, coitada!).
Enfim, meu objetivo era ter a capacidade de falar de igual para igual com “os grandes”, as pessoas que comandam outras pessoas. Entretanto, falar somente a língua deles não me basta mais, agora quero ter a capacidade de fazer com que essas pessoas compreendam a minha língua também, e é disso que trata o filme “5 Vezes Favela – Agora, por nós mesmos”.
Para que essa compreensão aconteça, ao meu ver, é extremamente necessário que essas pessoas saibam que ao lado da Comunidade Agrícola de Higienópolis (C.A. H.), quando chove, o rio Faria Timbó transborda, e um vizinho corajoso resgata um Jet ski, o liga, coloca sua sunga de praia, e tira uma onda andando de Jet Ski na Av. dos Democráticos; seria bom saberem também que a linha amarela quando construída e não inaugurada, era habitada por nós, crianças ainda, com nossos patins, bicicletas e pipas; aquilo era o Paraíso, meus joelhos contam essa história até melhor do que eu. É bom que todos, além disso, saibam que no tráfico há amigos de infância, amigos que não nasceram delinqüentes e muito menos morreram assim, tiveram um fim que já fora traçado por outras pessoas, aquelas que brincam de ser Deus entre uma taça de hipocrisia e uma pata de Lagosta.
É, infelizmente discursos comandam vidas.
Entre essas coisas todas tem um caso que me intriga muito. Vou pegar o exemplo da minha tia que me criou desde os nove anos de idade e não terminou o 2º grau. O que acontece é que ela assiste a todas as novelas e aos jornais e percebe a diferença entre a câmera HD e a Betacam. Ela desconfia das notícias do Jornal, fala que as coisas não são como mostram pra gente.
Esses eventos que citei acima não estão nas colunas sociais, mas é nelas que penso todos os dias durante a preparação para o Filme, a cada cena que me enxergo no roteiro, e por isso o meu encontro nostálgico com o meu projeto de futuro é mágico, estou me tornando menos ignorante, pois estou aprendendo a falar “nós vamos” além do “nós vai”, falar da Favela e dos E.U.A. Saber um pouquinho de tudo é melhor do que falar tudo sobre o nada.
Agora é por nós mesmos.
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