segunda-feira, 13 de junho de 2011

2º Filme do Ciclo LGBTT

O que fazer quando uma relação amorosa termina? Partir para outra ou se afundar amargurado em si mesmo?

Júlia (Ana Paula Arósio) é uma professora universitária de Literatura Inglesa que, ao ser abandonada por Antônia, após uma relação de mais de 10 anos, perde o chão e desaba com a sua torre de “inviolável” felicidade. Se o amor não dura para sempre, ela vai buscar o porquê no seu conturbado âmago. Mesquinha, amarga, egoísta, na sua dor, a solitária mulher quer solidão e não solidariedade de raros amigos. Quer desaparecer em si mesma e sem planos de renascer tal qual uma Fênix. Para Júlia, a dor é a única coisa que importa, é incomparável, é maior que ela própria. No entanto, a sua vida continua, mesmo que ela não queira, mesmo que se envenene (corroída pela autocomiseração). Assim, ao se dar conta das dificuldades em manter o que antes era dividido, se permite (quase que inconscientemente) viver em uma república com outros dois desafortunados pelo Cupido: o atorHugo (Murilo Rosa), que ainda sofre (mas busca dar a volta por cima) pela morte do companheiro, e a advogada Lisa (Natália Lage), abandonada grávida pelo namorado

Tragédia demais pra um filme só, não é verdade? Mas, superado o trauma inicial, conhecidos os personagens com as suas idiossincrasias, assiste-se com interesse. Baseado no livro Como Esquecer: Anotações Quase Inglesas, de Myriam Campelo, o drama intenso (introspectivo ao extremo) e com boa direção de Malu Martino, infelizmente, é uma obra para uma minoria cinéfila, indiferente e independente de qualquer preferência sexual. Também porque esta, felizmente, não é uma obra panfletária gay, com todos os cacoetes e caricaturas que geralmente o clichê pede, para ser palatável aos mais “religiosos”. A redução de platéia, aqui, se deve apenas à questão da sua temática pesada, repleta de citações e discussões literárias (Cassandra Rios, Virgínia Woolf, Emily Brontë), cuja narrativa pode parecer arrastada demais. É curioso observar como a diretora trabalha o tempo de reflexão (à dor) de JúliaHugo eLisa, que podem partilhar suas tragédias amorosas, mas não partilham os seus desejos e apostas futuras.

Como Esquecer é essencialmente um filme sobre amor e desamor. Um drama que explora o vazio na vida de Júlia, que perde a noção do afeto (possivelmente por conta de uma convivência submissa e possessiva com Antonia), mas também tange em outras formas de se encarar e reagir à perda ou ao abandono de quem se ama. Apesar do clima de melancolia, há algum humor (mesmo que ácido) na grosseria de Júlia, em resposta à insistente necessidade dos amigos em fazê-la feliz. Ela não quer (mais) a felicidade que vem de fora, já que precisa descobrir se há (ainda) alguma dentro dela mesma. Ela precisa aprender a esquecer. A sua catarse é lenta, como o ritmo da narrativa que inquieta o espectador (apressado), ao perceber que a personagem e a diretora têm a faca e o queijo nas mãos, mas parecem não (querer) encontrar a goiabada.

Como Esquecer talvez cause estranheza, pelo híbrido diálogo cinema/literatura. Ora se assiste o livro e ora se lê o filme. Tem uma fotografia naturalista agradável (muita gente é capaz de achar escura e sem vida) aos cuidados de Heloisa Passos, uma trilha boa e discreta e um final compatível com o enunciado. Realmente não poderia ser diferente. Ele traz uma Ana Paula Arósio que, longe da mesmice televisiva que a consagrou, surpreende num papel difícil e com o mérito de, apesar de toda antipatia da sua personagem, provocar empatia no espectador. Na verdade todo elenco está bem, Murilo Rosa convence ao fazer um amigo gay, nada caricato, assim como Bianca Comparato, na pele deCarmen Lygia, a insistente aluna de Júlia, e Arieta Correa, como a artista plástica Helena. É um filme pra quem quer alternativa (ôps!) ao cinema populista travestido em cine-denúncia à corrupção e outros tráficos brasileiros.



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